Quando Jesus é aceito,
isso muda a vida da pessoa. O quanto muda? Pessoas que passam por experiências
de proximidade à morte (quedas de avião, ataques terroristas, acidentes
automobilísticos, catástrofes, etc) admitem ter uma nova perspectiva. Revisam as
prioridades, enfocam relacionamentos, percebem a própria limitação da vida. Porém,
raramente essas pessoas eram a causa da situação que quase redundou em seu fim.
O passageiro de um avião não teve culpa da falha mecânica da aeronave. O funcionário
do banco não sabia que no seu turno se tornaria refém de perigosos assaltantes.
Em geral, não há culpa associada à catástrofe (às vezes, sentimento de culpa).
Em outros casos, há parcelas de responsabilidade: o pai que viu a família no hospital
se lamenta por ter economizado o valor da revisão de fim de ano; o casal
lamenta ter feito o passeio de lua de mel sabendo dos alertas de desabamento na
região. Mesmo nesses exemplos, não se percebe intencionalidade, desejo por
sofrer ou ver outros sofrerem. A proximidade da morte é mais bem vista como
fatalidade, talvez azar, mas sem intenções causais.
Por isso, o paralelo da
experiência de escapar da morte com a da salvação espiritual só pode ser
parcial e incompleto: no primeiro caso, fatalidade e impacto suficiente para
reordenar áreas específicas da vida; no segundo caso, culpabilidade e impacto suficiente
para afetar por completo a existência. Isso merece um comentário para ser bem
compreendida (a) a culpabilidade e (b) o tipo de impacto que engendre todas as
esferas da vida.
A culpabilidade se refere
ao fato de que a situação antes da salvação é de responsabilidade humana. Se o
encontro com Jesus nos muda, temos de analisar o que havia antes do encontro
que exigisse mudança. E o que havia era degradação, por culpa da vontade. O pecado
afeta as escolhas, os hábitos, as palavras, as intenções (mesmo as que vestem smoking!). Aqui se estabelece um ponto
crucial na compreensão da mudança efetuada por Jesus: só é possível entende-la
corretamente quando se assume o efeito global do pecado. Limitar a atuação do
pecado implica em reduzir o que salvação efetuou. Igualmente essencial é notar
que, uma vez maculado pelo mal, a única solução seria esperar uma atuação
externa, jamais qualquer contraparte interna, iniciativa do próprio homem. O
gênero humano não é apenas responsável pela sua condição pecaminosa, como
igualmente incapaz de dirimir seus efeitos. Assim, pode dizer que o homem vive
em estado perpétuo de culpa pela condição pecaminosa, da qual nada pode fazer
para se livrar, pela qual é responsável.
O tipo de impacto
proporcionado pela salvação é mais abrangente se comparado com as experiências
daqueles que estiveram próximos da morte por uma razão simples: antes da
salvação, todos estávamos mortos (Cl 2:13). O próprio Jesus disse, em um
aforismo cheio de sabedoria, que os mortos (em sentido espiritual) se
preocupavam em cuidar dos mortos (em sentido literal), ou seja, se limitam a
cumprir as obrigações da vida, sem se preocupar em seguir Seu chamado (Lc
9:60). Se pecado é morte, salvação é vida, nova vida, ressurreição. A salvação
é ressurreição, não apenas porque se diz que morremos por causa do pecado (Ef 2:5-6), como também para o pecado (Rm 6:10-11). Se o pecado traz morte (Rm 6:23), mesmo
vivos estamos como mortos (como Adão e Eva, que comeram do fruto e morreram,
sem, de fato, morrer naquele exato
momento), pela certeza de que a morte será a sentença irrevogável.
Entretanto, ao nos
outorgar a salvação, automaticamente Deus nos deu vida, vida em Cristo! Se a
palavra da verdade nos deu vida (Tg 1:18), essa deve ser uma vida de obediência
à verdade (1 Pe 1:22). Por isso experimentamos a salvação como uma mudança
completa de vida, no sentido de que a vida nova precisa implicar em obediência.
Se salvação traz vida e vida de obediência, experimentamos a salvação na sua
dimensão relacionada à obediência, ou aquilo que denominamos santificação (Hb
12:14). Afinal, o perdão divino, ou etapa da salvação a qual chamamos justificação
(Rm 5:1; Ef 2:8), é um ato instantâneo, ocorrido no passado; sobre a última etapa, a glorificação, não poderemos provar
até que Jesus nos transforme em Sua vinda (1 Co 15:53-54; 1 Jo 3:1-2), no futuro. Assim nos resta pensar e
viver a salvação em termos de santificação, ou seja, sob o impacto da nova vida
recebida (Cl 3:1) e em preparação para o ato de transformação final que se dará
na volta de Jesus (1 Jo 3:3). A santificação é a dimensão presente da salvação, aquilo com o que devemos nos ocupar agora. Por
isso, a obediência na vida cristã assume um papel tão destacado: revela o
impacto da salvação recebida (passado) e nos condiciona a alcançar o alvo da
esperança (futuro).
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